CXXIII - bolso do coração
A regra de ouro da economia foi sempre a de considerar o bem-estar como simples função do rendimento. Mas um grupo crescente de estudos mostra que só a riqueza não nos torna necessariamente feliz. Ultrapassado um determinado patamar de rendimento, já não conseguimos aumentar a felicidade.
David Cameron, líder dos conservadores britânicos, num discurso recente, propôs a adopção de um Índice de Bem-Estar Geral: “ Não deveríamos estar a pensar apenas em como pôr dinheiro nos bolsos das pessoas, mas também no que fazer para pôr alegria nos seus corações”. O Produto Interno Bruto não deverá ser o objectivo dominante da política. Deverá ser feito um grande esforço para erradicar a pobreza extrema do mundo. E o Estado deverá centrar-se em reparar os danos e ao mesmo tempo evitar gerar outros.
David Cameron, líder dos conservadores britânicos, num discurso recente, propôs a adopção de um Índice de Bem-Estar Geral: “ Não deveríamos estar a pensar apenas em como pôr dinheiro nos bolsos das pessoas, mas também no que fazer para pôr alegria nos seus corações”. O Produto Interno Bruto não deverá ser o objectivo dominante da política. Deverá ser feito um grande esforço para erradicar a pobreza extrema do mundo. E o Estado deverá centrar-se em reparar os danos e ao mesmo tempo evitar gerar outros.
A política da felicidade não tem nada de novo. Na sua “Ética Nicomaqueia”, Aristóteles designa a “eudaimonia” – a felicidade – como objectivo da vida. Num belo discurso, o falecido Robert Kennedy, ex-procurador-geral dos USA, disse que “aquilo que faz com que a vida mereça ser vivida” é “a saúde dos nossos filhos, a qualidade da sua educação, a alegria das suas brincadeiras, a solidez dos nossos casamentos (...), a nossa dedicação ao país e o nosso espírito (...), a nossa sensatez e a nossa coragem”. E Robert Kennedy sublinhou que nada disto entrava para o cálculo do Produto Interna Bruto (PIB). Assim se verifica, que a qualidade de vida é mais importante do que a quantidade de dinheiro, que aquela não se esgota nesta.
A política para a felicidade deve assentar, sobretudo, na partilha das responsabilidades e “não somente na prosperidade e na liberdade”, como salienta Richard Layard, da London School of Economics e deputado na Câmara dos Lordes britânica, pelo Partido Trabalhista.
A felicidade da sociedade exige, afinal, que cada um de nós cumpra o seu papel. E cumprir o seu próprio papel contribui para a felicidade individual e consequentemente para a felicidade colectiva. É por isso que temos necessidade de uma revolução das responsabilidades.
No século XIX, a economia era conhecida como a “ciência da felicidade”. Os economistas pediam aos governantes que promovessem mais felicidade e defendiam um sistema fiscal progressivo, alegando que um dólar daria mais felicidade a um pobre do que a um rico. Mas, nos anos 30, os psicólogos subverteram a economia ao estilo de Bentham. Behavioristas como B.F. Skinner, de Harvard, afirmaram que seria anti-científico tentar medir fenómenos “mentais” obscuros como os pensamentos e os sentimentos. Dado que as respostas físicas (comportamentos) são os únicos dados fiáveis, o cientista social teria de basear as suas teorias no modo como as pessoas reagem aos estímulos. Para os economistas, isto era equivalente à Revolução de Copérnico: se os sentimentos das pessoas não podiam ser medidos nem comparados, o objectivo de aumentar a felicidade colectiva não fazia sentido. Por isso, seguiram os behavioristas e centraram-se nas acções das pessoas, em vez de maximizar a felicidade, o objectivo passou a ser maximizar a possibilidade de as pessoas satisfazerem os seus gostos ou preferências, comprando ou vendendo mercadorias. Na verdade, a tónica deixou de ser colocada na felicidade para ser colocada na liberdade – na remoção das barreiras que impedem as pessoas de serem elas a escolher.
O problema é que o capitalismo de consumo, as políticas de mercado que desde então varrem o mundo, explora a ânsia humana da renovação do apetite, os psicólogos mostram claramente a distinção entre Bem-Estar – que apenas cria um maior desejo por mais prazer, Síndrome do Sem-fim Hedonístico – e Estar-Bem, que pode conduzir à felicidade duradoura. O prazer por si só não basta, pois a exaltação é transitória, viciante e insaciante. A verdadeira felicidade vem com o significado, com a entrega pessoal, diz-nos o psicólogo e professor universitário americano, Todd Kashdan.
É aqui, neste ponto desta reflexão, que se jogam claramente as ideias-chave: Responsabilidade e/ou Liberdade, Bem-Estar e/ou Estar-Bem: Talvez chegue o dia em que se perceba que o caminho para uma sociedade mais feliz passe por cada um de nós assumir as suas responsabilidades na prossecução e efectiva realização do Estar-Bem próprio e que se tente deslizar o mínimo possível para os “esquemas mercantilistas” que iludem a própria Liberdade no falso bem-estar que nos é vendido pelo sistema publicitário, porque aquilo que faz, ao fingir que nos está a oferecer um leque de escolhas, é tomar o nosso lugar na descoberta daquilo que queremos.
Aristóteles há muito que nos avisou:
“ a virtude não existe se não optarmos por ela”